Sartre e o marxismo

terça-feira, 10 de abril de 2012
"Os títulos profissionais em todas as sociedades estratificadas mostram, por um lado, uma tendência para o conservadorismo, ao passo que, por outro lado, o seu significado muda para funções muito diferentes."  -  Gwendolyn Leick  -  Mesopotâmia  -  A invenção da cidade

“o marxismo [...] permanece, pois, a filosofia de nosso tempo: é insuperável, pois as circunstâncias que o engendraram não foram ainda superadas”.
Sartre sempre teve uma relação ambígua com o marxismo. Adere ao materialismo histórico, segundo o qual as relações de produção condicionam o desenvolvimento da cultura e das instituições. Por outro lado, Sartre nunca chegou a concordar com o materialismo dialético, que julgava ser uma metafísica – como outros pensadores contemporâneos a Sartre, entre os quais Bertrand Russel e Karl Popper. O problema com o materialismo dialético, segundo Sartre, era que este era “projeção” sobre a natureza e não poderia ser provado – apesar de que Sartre admitisse de que eventualmente pudesse existir.
Em sua obra Questão de Método (1957), da qual foi tirada a citação acima, Sartre escreve por que permanece existencialista, não se tornando marxista:
“O que faz então com que não sejamos muito simplesmente marxistas? É que consideramos as afirmações de Engels e de Garaudy princípios diretores, indicações de tarefas, problemas e não verdades concretas; é que elas nos parecem insuficientemente determinadas e, como tais, suscetíveis de numerosas interpretações: numa palavra, é que elas nos aparecem como idéias reguladoras.” (Sartre, 1972, p. 34).
Em toda a obra Questão de Método Sartre – apesar de esta obra ser de certo modo um “acerto de contas” de Sartre com o marxismo – o filósofo francês mantêm uma posição crítica em relação à filosofia marxiana, escrevendo, por exemplo, que:
“O marxismo estacionou: precisamente porque esta filosofia quer transformar o mundo, porque visa “o tornar-se-mundo da filosofia”, porque é e quer ser prática, operou-se nela verdadeira cisão que jogou a teoria de um lado e a práxis do outro.” (Ibidem, p.23)  
No entanto, parece que Sartre reconhece a importância da filosofia marxista, ao considerá-la como a filosofia de seu tempo, resultado de condições econômicas e sociais que ainda não haviam sido ultrapassadas. O marxismo era uma filosofia crítica à burguesia e a seu sistema econômico, o capitalismo. E é exatamente por este fato – a não superação das circunstâncias que o engendraram – que o marxismo permanecia tão forte, na visão de Sartre. Escreve Renato dos Santos Belo:
“Quando Sartre, em Questões de Método, explicita que a posição do existencialismo em relação ao marxismo é para definir este último como a “filosofia reinante de nossa época”, frente à qual o existencialismo só poderia figurar como uma ideologia, que vive às margens da “filosofia insuperável de nosso tempo” e dela é dependente.” (Belo, 2011).
Sartre nunca aderiu explicitamente ao marxismo, apesar de considerá-lo a principal filosofia de sua época. De nossa parte, cabe analisar se nos dias atuais o marxismo ainda permanece atual, e em que aspectos.
Como teoria crítica do capitalismo é inegável que as idéias de Marx permanecem atuais. Por outro lado, é preciso abandonar aquelas idéias que acabaram se tornando ideologia dentro do marxismo, como o materialismo dialético, transformado em dogma científico na União Soviética nos tempos stalinistas. Se muitas previsões feitas por Marx e relacionadas com o desenvolvimento da economia não se concretizaram até o momento, pode ser que a médio e longo prazo algumas venham efetivamente a ocorrer. Talvez, a própria dinamicidade do capitalismo, com suas idas e voltas, acabe dando razão ao pensador alemão.  
Bibliografia:
BELO, RENATO DOS SANTOS. Sartre e as marcas de seu tempo: investigação sobre as figuras da subjetividade e da alienação na relação entre existencialismo e marxismo Disponível em: 
REALE, GIOVANI, ANTISERI, DARIO. História da Filosofia Vol. III. São Paulo. Paulus Editora: 1991, 1113 p.
SARTRE, JEAN-PAUL. Questão de método. São Paulo. Difusão Européia do Livro: 1972, 148 p.
(Imagens: fotografias de Philipe Halsman)

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